A solidez do passado hoje é negada
veementemente pelos tecnólogos e burocratas, mas esquecem-se que o ontem foi o marco
construtivo do presente, onde se permitiram verdadeiras situações referenciais do hoje e
que dirá para o futuro.
Agora entendemos porque existe a Igreja Martin Luther, na Dom Pedro II.
No momento em que Porto Alegre busca a sua expansão para o nordeste, encontra uma coxilha
que tem que ser desbravada, loteada e aberta uma avenida para valorizar os terrenos,
assim, o que fazer para incrementar e chamar a atenção para o local.
O pior terreno foi oferecido a Igreja Luterana para que edificassem a sua Igreja.
Recentemente chegado da Alemanha, o arquiteto Sigfried Bertold Costa adota um projeto que
lhe foi solicitada em 1933, com uma linguagem simples e funcional, mostrando uma
identidade para o templo. Tudo isso sobre as novas influências alemãs para a arquitetura
que começava a aparecer na década de trinta. Assim, podemos ter aqui um exemplar
legítimo, mesmo antes que na Europa, tendo sido concluída em 1936, o que era condição
fundamental para se consagrarem os atos de cedência definitiva da área a comunidade
Luterana.
Surge uma Igreja, as chácaras, a SOGIPA. Define-se uma paisagem urbana, cultural e na
memória desta região da cidade e a Igrejinha passa a fazer parte da lista dos marcos
referenciais da cidade e do cidadão.
Casamentos, batismos e formaturas acontecem no ponto de encontro da comunidade, cria-se
mais que a identidade, surge uma alma pujante para o bairro e para a cidade.
Silenciosamente o tempo vê as pessoas, as casa, os edifícios, os carros e a poluição
chegaram e fica com os seus 62 anos a solicitar ajuda, pois sabe que o progresso e
desenvolvimento, são situações maléficas para o passado, já que vive na plenitude da
sabedoria da alma da comunidade, obtendo uma enfermidade tão preocupante que foi
convocado os maiores especialistas, para tentarem encontrar encaminhamento adequado para o
seu caso, que é o de querer viver.
Surgem alternativas, a primeira: normalmente adotada nos casos de argumentação simplista
e imediatista, a amputação ou transferência de local, fraca e impotente para os homens
que não tem alma e boa vontade, a segunda cara e sofisticada, na condição de túnel, de
alta engenharia, reúnem-se para adotar tecnologias, rejeitada pelos economistas. A
terceira, deslocamento sobre o eixo principal, aceita somente quando não existem mais
outras alternativas. E a quarta, que sugere e propõe somente uma flexibilização e
redução do gabarito de 40m de avenida, onde aconteça naturalmente também reduções de
velocidade, desde que a estação da Igrejinha passe para a parte de baixo da esquina e
que também seria a maneira de integrar os dois lados da avenida, já que, em qualquer
outro caso, seria segregadora a relação do bairro com a Igreja, a Escola e a SOGIPA.
O interessante é que quando se fala de memória, temos somente dois mundos - o dos
preocupados com a manutenção da autenticidade das obras de arte e monumentos e os que
acham que o futuro é quem diz e condiz os valores a serem seguidos. Mas ambos esquecem
que o que marca a trajetória sadia de uma comunidade é o que se expressa pelos seus
elementos e símbolos, marcados na sua paisagem mental, já que a memória é a expressão
viva das energias gastas pelos homens de boa fé que ajudaram a construir o nosso
presente. Portanto, marco único para referenciar as ligações das gerações, no espaço
e no tempo.
O futuro só a Deus pertence e aos Homens que tem o discernimento e o poder de encaminhar
diretrizes para um planejamento que atenda a todos interesses. No nosso caso, o entorno do
sítio está a clamar aos técnicos que encontrem a realidade possível de integração
desta área de conflito para eles, e não para nós, já que as comunidades do entorno
(C.E.P.A., Escola, Igrejinha, SOGIPA, etc), estão a perceber que mais que progresso temos
que valorizar o que é nosso. O que se faz como representação viva das questões
culturais e ambientais, já que as normas internacionais nos orientam assim, é que o
amanhã não se constrói se não tiver um hoje sadio, consistente e consciente, onde o
papel da ciência é permitir que a vida do Homem se amplie pela sabedoria da juventude.
Uma cidade com alma é eternamente uma cidade forte, autêntica e solidamente instalada
nas tendências mundiais para a estabilização dos conceitos de cidadania, que é
valorização do Homem, junto ao meio em que vive, junto a paisagem que domina e
principalmente não os subjugar aos propostos das manifestações autoritárias de quem
quer que seja.
Nestas inflexões é que a Arq. Karla Seibel procurou o ICOMOS (Conselho Internacional de
Monumentos e Sítios), entidade ligada a UNESCO ONU, onde foi importante angariar uma luta
iniciada por poucos e que hoje já toma forma e conteúdo de resgate da paisagem, é a
dinâmica possível de sanar a anomalia que se gerou com a criação de uma artéria que
não quer respeitar a MEMÓRIA VIVA DA CIDADE e que se impõe mais pela teimosia do que
pela sabedoria. |
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